“Enquanto você estiver vivo vai ter louça.”

Ida Feldman

Essa aí é uma das verdades da vida para cidadão médio. Muito bem traduzida por Ida Feldman e comercializada pela Tok Stok (compra lá que uma parte do $ vai pro bolso de uma mulher foda). Essa realidade tão inescapável quanto a morte ficou especialmente gritante durante o isolamento. Enquanto a gente tenta ignorar, para o bem da nossa saúde mental, a sombra da morte pesando sobre o mundo como nossas gerações nunca sentiram, nos apegamos e sofremos com os pequenos desastres do dia a dia dentro de casa. A constante presença de louça suja é uma delas.

Chega-se a desconfiar que elfos, doendes, gnomos, demônios ou personagens da cabecinha maravilhosa do Murakami entram na nossa casa quando estamos dormindo ou distraídos para sujar louça depois de termos passado uma hora e meia em frente a pia lavando cada garfo, pote (bowl para os publicitários, mas também pode chamar de tigela se quiser) e panela.

E por mais que aqueles minutos de cozinha limpa tragam paz ao coração e à mente da pessoa criada em uma sociedade que associa cuidado da casa à realização pessoal feminina, a ausência de sujeira revela também a ausência de vida. Uma cozinha limpa é uma cozinha morta.

Louça suja significa que alguém cozinhou, transformou um ingrediente em comida, deu vida a uma receita, alimentou a si mesmo ou outra pessoa. Cozinha suja, dentro do que cada um ou a vigilância sanitária considera aceitável, é uma cozinha viva.

Um pia cheia de louça pode significar que você não teve energia física ou emocional para lidar com as obrigações sanitárias da vida adulta, mas também pode significar que você teve energia para se alimentar, para criar, para esquentar no microondas, que seja. Para ocupar esse espaço na sua casa e na sua vida com movimento e intenção de nutrir.

Que enquanto você estiver vivo, tenha louça!